I
ontem à noite me bateu uma puta melancolia e como tem dias
que a melancolia vira uma tristeza fodida fui ler Manuel António Pina – hoje sei:
escrevo/ contra tudo de que me lembro/ esta tarde parada, por exemplo – uma
mirabolância dos sentidos acontecendo no lado de dentro. a coisa mais bonita nessa
vida é se emocionar. fui dormir quase às 4h. acordei às 8h depois de sonhar que
eu fazia xixi numa cachoeira e, ufa, - risos – deu tempo de correr até o banheiro.
voltei a dormir como quem não tem o dia inteiro para viver e acordei de novo às
11h11, hora que todo dia uma saudade me acontece. e aconteceu de mais uma vez
eu não te procurar, mas você ainda permanece como se esses buracos aqui fossem
também sua casa. silêncio: coisa constante.
II
uso sempre as mesmas palavras para
me referir a você. encontrei aquele bilhete para são paulo dentro do livro da
Ana C. lembra que lemos esse livro na cafeteria rodeadas de astromélias. lembra?
você fez uma foto. clique. ficou bonita. ainda disfarço todo esse amor entre as
palavras. a longa gengiva aparecendo. a gargalhada fugida da boca do estômago. o
aparecimento repentino em ouro preto ao meio-dia vindo trazer novidades tardias.
e meu livro que comprou em Portugal. eu sei, me encantei pelos portugueses. entrego também com atraso seu presente de
aniversário. faço que sou dura. mas sinto uma saudade intratável. crueldade
intensa com o coração. o amor tremula de mão em mão como o olho pula, involuntariamente. sobressalto-me.